A Desobediência Civil - Henry Thoreau
Autor: Lorran Kaliê
A Desobediência Civil - Henry Thoreau
Série: Obra da matriz do PAS (Programa de Avaliação Seriada) da segundo etapa, equivalente ao 2º ano da ensino médio
Conteúdo: O conteúdo a ser trabalhado envolve os principais pontos da obra de Thoreau, sendo eles:
A deslegitimidade em pagar impostos que financiam guerras e escravidão;
- A legitimidade de impostos que servem para benefícios sociais;
- A desobediência civil como forma pacífica de se revolucionar leis injustas;
- A imoralidade de leis injustas;
- Uma oposição ao contrato social de necessidade do Estado;
- Um apoio ao Estado mínimo.
Objetivo: Compreender a lógica das ligações que Thoreau faz entre um Estado grande e controlador que respalda leis imorais e como a desobediência civil é uma forma legítima de se fazer ação política.
Idealmente, a aula deveria ser desenvolvida após serem trabalhados em sala de aula a temática do contrato social e os seus principais autores, Hobbes, Locke e Rousseau, isso pois no momento histórico da obra de Thoreau, A Desobediência Civil serve como uma crítica a vários dos pressupostos de legitimidade do Estado e da formação social dos contratualistas, principalmente do Leviatã de Hobbes. Essa situação na sala de aula pode facilitar o objetivo que buscamos da compreensão epistemológica de Thoreau.
Desenvolvimento: Thoreau decidiu escrever sua obra após ser preso por não pagar seus impostos. A ideia da aula então é simular um julgamento de Thoreau, para tornar a aula mais dinâmica e participativa.
Para garantir uma participação mais ativa na própria construção da aula, o professor pode começar a organizar a atividade na aula anterior a que será feita a atividade. A sala deverá ser dividida em 3 grupos, sendo atribuídos a eles o grupo de acusação, defesa e júri.
O grupo de acusação representará os interesses do Estado, formulando as acusações que serão usadas contra Thoreau. Para isso os alunos ficarão encarregados de se apropriar dos argumentos que advogam sobre a necessidade e benefícios do Estado na manutenção da harmonia e ordem social, sendo orientados inclusive a utilizarem argumentos dos contratualistas, que idealmente terão sido trabalhados nas aulas anteriores.
O grupo de defesa representará os advogados de Thoreau. Esse deverá ser o grupo com que o professor irá trabalhar de forma mais direta. Daqui o professor ficará encarregado de selecionar os trechos da obra trabalhada que melhor apresentam a teoria do autor e ainda selecionar palavras-chave ou fazer pequenos resumos para que o grupo possa se apropriar de maneira palpável das ideias de Thoreau. Cabe aqui dizer que nessa dinâmica, o professor poderia preferencialmente desempenhar o papel como um personagem, sendo o próprio Thoreau, dessa maneira o professor poderia se envolver como participante da dinâmica e fazendo as intervenções necessárias para melhor elaborar sobre as "suas" ideias.
O grupo do júri deverá ser o menor grupo para facilitar a própria dinâmica do seu trabalho, sugiro que de no máximo 5 pessoas, mas tendo em mente claro que esse número pode ser muito variável dependendo da quantidade de alunos em uma sala. Esse grupo ficará encarregado de atentamente analisar o debate entre os dois grupos para criar um mapa conceitual acerca dos temas que estarão sendo postos. O mapa conceitual é de fundamental importância pois ele que dará a base definitiva do objetivo da aula, fazendo as ligações entre os temas e que ficará exposto para todo mundo da sala ter a visualização completa das conexões e teorias interligadas.
O mapa conceitual inclusive tem uma importância tão grande que ele não será finalizado apenas da maneira que foi feita pelo grupo do júri. O júri após formular o mapa irá expor ele para todos os colegas, que discutirão coletivamente pontos que podem ser melhorados, novas ligações que podem ser feitas ou ainda dissociar conexões feitas que por ventura não foram bem elaboradas. O professor também poderá ter papel ativo nessa formulação.
Dinâmica sugerida: As aulas de sociologia geralmente tem carga horária de 50 minutos a 1 hora semanais, pensando nesse tempo sugiro a seguinte divisão de tempo para a realização da atividade:
A divisão dos grupos e explicação das suas funções deverá ser feita na aula anterior a da atividade para maximizar o tempo da aula;
15 a 25 minutos da aula para organização dos grupos, incluindo debate interno sobre o tema e definição da ordem de exposição dos temas e membros que irão apresentar;
5 minutos para o grupo de acusação expor o seu caso contra Thoreau;
5 minutos para o grupo de defesa expor o seu caso a favor de Thoreau;
10 minutos para debate direto entre os grupos;
O tempo restante que será relativo, dependendo do tempo de aula de cada instituição, variando entre 10 e 20 minutos, poderá ser utilizado para o júri apresentar o mapa conceitual e ser analisado e discutido pela sala;
A depender do planejamento anual do professor, uma aula inteira pode ser utilizada exclusivamente para a exposição e debate dos grupos e a aula seguinte ser apresentado o mapa conceitual pelo júri para ser trabalhado com toda a sala com mais tempo.
Avaliação: A avaliação poderá ser feita pelo professor mediante a observação da participação na dinâmica e pela análise do mapa conceitual final, quando toda a turma já tiver contribuido.
Anexo:
Trechos selecionados:
Item 1
Num governo que aprisiona qualquer pessoa injustamente, o verdadeiro lugar de um homem justo é também a prisão. O lugar apropriado, hoje, o único lugar que Massachusetts proporciona a seus espíritos mais livres e menos desesperançados, são seus cárceres, nos quais se verão aprisionados e expulsos do Estado, por ação deste, os mesmos homens que já haviam expulsado a si mesmos por seus princípios. É ali que deverão encontrá-los o escravo foragido, o prisioneiro mexicano em liberdade condicional e o índio que queiram protestar contra as injustiças sofridas por sua raça; naquele lugar à parte, embora mais livre e honroso, em que o Estado coloca aqueles que não estão com ele, mas contra ele - o único lugar num Estado escravo em que um homem livre pode viver-se com honra. Se alguém pensa que ali sua influência se perderá, que sua voz não mais atormentará os ouvidos do Estado e que ele não será como um inimigo dentro de suas muralhas, é porque não sabe o quanto a verdade é mais poderosa que o erro, nem o quão mais eloqüente e eficazmente pode combater a injustiça aquele que já a tenha experimentado em sua própria carne. Dá o teu voto inteiro, não uma simples tira de papel, mas toda tua influência. Uma minoria é impotente enquanto se conforma à maioria, nem chega a ser uma minoria então, mas torna-se irresistível quando se põe a obstruir com todo o seu peso. Se a alternativa for a de manter todos os homens justos na prisão ou desistir da guerra e da escravidão, o Estado não hesitará em sua escolha. Se mil homens se recusassem a pagar seus impostos este ano, esta não seria uma medida violenta e sangrenta, como seria a de pagá-los e permitir ao Estado cometer violências e derramar sangue inocente. Esta é, de fato, a definição de uma revolução pacífica, se tal for possível. Se o coletor de impostos ou qualquer outro funcionário público perguntar-me, como um deles já o fez, "Mas o que devo fazer?", minha resposta será: "Se deseja realmente fazer algo, peça demissão". Quando o súdito recusar sua lealdade e o funcionário demitir-se de seu cargo, então a revolução terá se realizado. Mas suponhamos, até, que deva correr sangue. Já não se derrama uma espécie de sangue quando a consciência é ferida? Através deste ferimento esvai-se a verdadeira coragem e imortalidade de um homem, e ele sangra até a morte.
Item 2
Não é dever de um homem, na verdade, devotar-se à erradicação de qualquer injustiça, mesmo a maior delas, pois ele pode perfeitamente estar absorvido por outras preocupações. Mas é seu dever, ao menos, lavar as mãos em relação a ela e, se não quiser mais levá-la em consideração, não lhe dar seu apoio em termos práticos. Se me dedico a outras ocupações e projetos, devo ao menos verificar, inicialmente, se não o faço sentando sobre ombros de outro homem. Devo sair de cima dele, antes de mais nada, para que também ele possa ocupar-se de seus projetos. Vejam que gritante contradição se tolera. Ouvi alguns de meus concidadãos afirmarem: "Gostaria que me mandassem ajudar a sufocar uma insurreição de escravos ou marchar em direção ao México - vejam só se eu iria!". No entanto, estes mesmos homens, seja diretamente através de sua sujeição, ou indiretamente, pelo menos, através de seu dinheiro, forneceram substitutos para si mesmos. O soldado que se recusa a servir numa guerra injusta é aplaudido por aqueles que não se recusam a sustentar o governo injusto que faz a guerra, por aqueles cujos atos e autoridade ele negligencia e despreza, como se o Estado fosse penitente ao ponto de contratar alguém para castigá-lo enquanto peca mas não ao ponto de deixar de pecar por um momento sequer. Assim, em nome da Ordem e do Governo Civil, somos levados, finalmente, a homenagear e a sustentar nossa própria vileza. Depois do primeiro rubor do pecado vem a indiferença, e, de imoral, ela passa a ser, digamos, amoral, e não inteiramente desnecessária à vida que levamos.
Leis injustas existem: devemos contentar-nos em obedecer a elas ou esforçar-nos em corrigi-las, obedecer-lhes até triunfarmos ou transgredi-las desde logo? Num governo como este, os homens geralmente pensam que devem esperar até que a maioria seja persuadida a alterá-las. Pensam que, se resistissem ao governo, o remédio seria pior que o mal. Mas é culpa do próprio governo que o remédio seja, efetivamente, pior que o mal. É ele que o torna pior. Por que ele não está mais apto a antecipar e proporcionar a reforma? Por que não trata com carinho sua sábia minoria? Por que suplica e resiste antes de ser ferido? Por que não encoraja seus cidadãos a prontamente apontarem seus defeitos e a agirem melhor do que ele lhes pede? Por que sempre crucifica Cristo, excomunga Copérnico e Lutero e declara Washington e Franklin rebeldes?
Item 3
Existem milhares de pessoas que se opõem teoricamente à escravidão e à guerra, e que, no entanto, efetivamente nada fazem para dar-lhes um fim; que, considerando-se filhos de Washington e Franklin, sentam-se com as mãos nos bolsos e dizem não saber o que fazer, e nada fazem; que chegam a postergar a questão da liberdade em nome da questão do livre comércio, e, serenamente, após o jantar, lêem as listas com as cotações de preços junto com as últimas notícias do México, possivelmente dormindo sobre ambas. Qual é, hoje, a cotação de um homem honesto e de um patriota? Eles hesitam, e lamentam, e às vezes suplicam, mas não fazem nada a sério ou que seja eficaz. Esperarão, bem dispostos, que outros remediem (sic.) o mal, para que não precisem mais lamentar. O máximo que fazem, quando o direito lhes passa perto, é dar-lhe um voto barato, mostrando-lhe uma expressão débil e desejando-lhe felicidades. Há novecentos e noventa e nove defensores da virtude para cada homem virtuoso. Mas é mais fácil lidar com quem verdadeiramente possui algo do que com quem apenas o guarda temporariamente.
Toda votação é uma espécie de jogo, como o de damas ou o gamão, com um leve matiz moral, um jogo com o certo e o errado, com questões morais, naturalmente acompanhado de apostas. O caráter dos votantes não está em discussão. Dou meu voto, talvez, ao que considero direito, mas não estou vitalmente interessado em que este direito prevaleça. Disponho-me a deixar isto nas mãos da maioria. A obrigação desta, portanto, jamais excede a da conveniência. Mesmo votar em favor do direito é não fazer coisa alguma por ele. Significa apenas expressar debilmente aos homens seu desejo de que ele prevaleça. Um homem sábio não deixará o direito à mercê do acaso, nem desejará que ele prevaleça por meio do poder da maioria. Não há senão uma escassa virtude na ação de multidões de homens. Quando a maioria finalmente votar a favor da abolição da escravidão, será porque esta lhe é indiferente ou porque não haverá senão um mínimo de escravidão a ser abolida por meio de seu voto. Eles, então, serão os únicos escravos.
Exemplo de mapa conceitual: